Abuso Sexual Infantil Intrafamiliar: uma banalização judicial alarmante
Vamos falar de Incesto
Enquanto psicóloga clínica que acompanho vítimas de violência domestica e abuso sexual infantil, assisto diariamente a um fenómeno perturbador: a normalização judicial do incesto. É com profunda indignação profissional e humana que volto a levantar a voz.
O tratamento que os tribunais — não todos, mas demasiados — têm dado aos casos de abuso sexual infantil intrafamiliar é de uma frieza que beira a cumplicidade. A forma como certos juízes e procuradores tratam estes processos revela uma apatia institucional que chega a ser criminógena, protegendo agressores e punindo protetores.
Senhores Magistrados, não é aceitável que, em pleno século XXI, ainda se confunda ausência de marcas físicas com ausência de abuso. O abuso sexual infantil raramente deixa sinais visíveis — mas deixa feridas emocionais, neurológicas e relacionais profundas e irreparáveis.
Do ponto de vista clínico e científico, os efeitos do abuso sexual na infância incluem:
- Perturbação de stress pós-traumático complexo
- Depressão severa
- Dissociação
- Auto-mutilação
- Suicidio
- Repetição de vínculos abusivos
- Comprometimento do desenvolvimento do autoconceito, da sexualidade e da capacidade de confiar
E tudo isto ocorre silenciosamente, mesmo quando não há um único hematoma.
Exemplos reais que chegam até mim, enquanto técnica:
- Um pai “limpa” o ânus da filha com um cotonete e pede que ela o faça nele. A menina tem 3 anos. Não há marcas. Ela não tem voz em tribunal.
- Um brinquedo é usado para esfregar a vulva de uma criança de 4 anos.
- Um menino de 3 anos vê pornografia com o pai antes de dormir, sendo depois estimulado até à masturbação.
- Beijos na vulva e obrigar uma menina de 5 anos a lamber o pénis.
Não há marcas. Mas há trauma. E há crime.
Mas todos alegam ser inocentes até se provar o contrário (não há marcas e as perícias psicologicas são medíocres) In dúbio pro réu – nunca para a criança. Medidas de prevenção – raras. Resultado: as crianças continuam a ser abusadas, em processos crime longos 3, 4, 5 nos …e que muitos deles a investigação não deu inicio.
Se isto não é abuso sexual infantil, o que será?
Se isto não é negligencia por parte dos tribunais o que será?
Vamos ao caso da Elza — Um exemplo de inversão total da lógica judicial
A mãe, Elza, denunciou sinais consistentes de abuso sexual por parte do progenitor ao filho. O Tribunal da Relação do Porto, porém, indeferiu o seu pedido, argumentando que é necessário averiguar se a mãe está a obstruir o convívio com o pai — como se proteger fosse um ato criminoso.
O mais grave? A decisão foi tomada sem qualquer análise das provas periciais ou documentais constantes nos autos. Neste momento, Elza está a ser punida com coimas de 500 euros por cada incumprimento, por se recusar a entregar o filho a um alegado abusador. Está a ser castigada por exercer a sua função protetora, aquela que o Estado deveria apoiar.
Mas por que razão o tribunal não investiga com seriedade?
Porquê esta resistência sistémica em aplicar o princípio da precaução? Na dúvida, dever-se-ia proteger a criança e afastar o suposto agressor até apuramento cabal dos factos. Não é apenas legal. É humano. É ético. É científico.
Qual é a mãe que entrega um filho para um agressor-abusador? E por favor, já estamos fartos da ouvir como defesa “a mãe está alienar” sejam mais criativos, por favor!
Para mais informações sobre abuso sexual infantil e o conceito perturbador da alienação parental, fica o artigo da Meritíssima Juíza do Tribunal Supremo Dra. Maria Clara Sottomayor https://clarasottomayor.com/public/files/revista_julgar_13-2011-alienacao_parental.pdf
Sobre o CASO ELZA:
PodCast : https://lnkd.in/dF5_AAHz
Apelo da mãe Elza: https://lnkd.in/d-GD-8BA
LiVE: abuso sexual infantil: https://lnkd.in/dWYVVHjk