Como identificar o comportamento do Psicopata Integrado (Narcisista) nos tribunais?

Como identificar o comportamento do Psicopata Integrado (Narcisista) nos tribunais?
Publicado em: 26/02/2025

Daniela Cosme – Psicologa Clínica e Psicoterapeuta

Para entender como funciona esse tipo de perfil, é fundamental analisar o modo como o

“vírus” do narcisismo age. Ele se insere nas dinâmicas relacionais utilizando uma estratégia

de manipulação chamada love bombing. Num relacionamento narcisista, é possível identificar

três fases bem definidas: idealização, desvalorização e descarte.

Fase 1: Idealização

Nesta etapa inicial, o narcisista recorre a técnicas de manipulação como love bombing e

future faking, cujo objetivo é criar um vínculo de confiança. A vítima é induzida a acreditar

que encontrou a sua “alma gémea”, o que desencadeia uma descarga de dopamina no cérebro,

fortalecendo a ligação emocional com o abusador. Estas estratégias são meticulosamente

desenhadas para fomentar uma dependência emocional. Posteriormente, durante a fase de

desvalorização, a vítima tende a sentir vergonha e assumir a culpa que, na realidade, pertence

ao narcisista. Confusa e incapaz de compreender a transformação do “príncipe encantado”

num “sapo terrível”, acaba por acreditar que a responsabilidade é sua.

Fase 2: Desvalorização

Quando o narcisista percebe que a vítima já se encontra emocionalmente capturada, inicia-se

a fase de desvalorização. Nesta etapa, emergem os micro-abusos e o recurso a estratégias

como gaslighting, silêncio punitivo e reforço intermitente, entre outras. (pode consultar as 17

estratégias de manipulação narcisista que identifiquei e descrevi no meu instagram) Estas

técnicas de manipulação criam um duplo vínculo, caracterizado por uma relação oscilante

entre abuso emocional e esparsos gestos de atenção ou afeto. Este padrão constitui uma forma

de abuso psicológico que, embora não deixe marcas físicas, gera profundas cicatrizes

emocionais.

Fase 3: Descarte

Quando a vítima se encontra emocionalmente fragilizada e já não é útil como fonte de

“suprimento” para o narcisista, esta é descartada. Contudo, o narcisista pode regressarutilizando a estratégia de manipulação denominada hoovering: uma tentativa de verificar se a

vítima continua vulnerável e sob o seu controlo. Assim, o ciclo de abuso pode perpetuar-se ao

longo de anos.

Caso a vítima decida romper a relação e procurar ajuda, o narcisista frequentemente recorre à

estratégia dos “macacos voadores”, manipulando terceiros para denegrir a imagem da vítima

e implementar campanhas de difamação. É essencial compreender que, ao lidar com um

narcisista, o foco deve estar no comportamento e não nas palavras, uma vez que estes

indivíduos são mestres em discursos manipulativos e demagógicos.

O Narcisismo: Uma Patologia da Maldade

É fundamental reconhecer que o narcisismo é, na essência, uma patologia da maldade.

Diferentemente das vítimas, os narcisistas não experienciam vergonha, culpa, tristeza,

empatia ou remorso. A incapacidade de amar, inclusive os próprios filhos, é uma

característica inerente à sua condição, pois estes são frequentemente utilizados como

instrumentos para alcançar objetivos ou satisfazer necessidades.

Os narcisistas não toleram estabilidade emocional. Para eles, o amor está inexoravelmente

ligado ao conflito e à destruição, um reflexo inequívoco da sua patologia. Acreditar que

possam ser bons pais é uma ideia ingénua e profundamente errónea.

A fórmula comportamental dos narcisistas é clara: cometem atos prejudiciais, recusam-se a

assumir responsabilidades e projetam a culpa nos outros, frequentemente nas parceiras,

assumindo-se como vítimas. Os filhos tornam-se ferramentas para infligir sofrimento às

mães e alcançar os seus objetivos, frequentemente para limpar a imagem associada a

violência doméstica ou abuso sexual dos próprios filhos.

Narcisismo e os Tribunais

Nos casos de disputas judiciais envolvendo filhos, emergem padrões preocupantes:

Alienação parental: O narcisista abandona ciclicamente o lar e desresponsabiliza-se,

mas reaparece exigindo direitos parentais. Quando contrariado, recorre a ameaças

legais ou, em muitos casos, à subtração do menor. Quando denunciado, manipula a

situação, alegando falsidade na denúncia e reclamando os seus direitos parentais.

Campanhas de difamação: O narcisista mobiliza os “macacos voadores” para isolar

a vítima socialmente, afastando-a da família e dos amigos. O objetivo é deixá-la

desprovida de suporte emocional, mais vulnerável e incapaz de denunciar os abusos.

Abrindo processos de difamação, passando a vítima ser arguida em vez do verdadeiro

criminoso.Processos judiciais manipulativos: Contratam advogados agressivos, conhecidos

como “pit bulls”, que utilizam estratégias similares às do próprio narcisista.

Nos tribunais, o cenário é frequentemente desolador. Casos de violência psicológica ou física

são frequentemente desacreditados por alegações de alienação parental e difamação,

prejudicando a credibilidade da vítima, que muitas vezes, sofre de stress pós-traumático

complexo.

Estratégias para a Proteção de Vítimas e Crianças

Para garantir a proteção das vítimas, com especial atenção às crianças, torna-se

imprescindível a implementação de estratégias específicas:

Medidas de proteção imediata: Sempre que haja denúncia de violência doméstica ou

abuso sexual de menores, devem ser adotadas medidas de proteção eficazes. Em

qualquer situação de suspeita, é essencial garantir a segurança das vítimas, prevenindo

a convivência com os agressores. Em caso de dúvida, a prioridade deve ser proteger a

criança.

Colaboração interdisciplinar: Parcerias entre advogados e psicólogos

especializados, preferencialmente Psicólogos Forenses, são fundamentais. Pareceres

técnicos qualificados são indispensáveis para fundamentar os requerimentos legais e

assegurar a salvaguarda das vítimas.

Rigor nos procedimentos periciais: As avaliações periciais devem ser realizadas

com a máxima competência e precisão, de forma a evitar que menores sejam

obrigados a conviver com progenitores agressivos, garantindo assim a sua integridade

física e emocional.

Formação específica para magistrados: Juízes e outros profissionais do sistema

judicial devem ser capacitados para compreender os impactos psicológicos associados

ao narcisismo, reconhecer os padrões comportamentais característicos e avaliar as

consequências traumáticas do convívio com personalidades perturbadoras.

Combate a preconceitos culturais: É urgente eliminar a crença machista e misógina

de que, mesmo sendo agressivo ou abusador, um progenitor deve manter contacto

com a criança. Esta visão, ao desvalorizar as denúncias da mãe, contribui para a sua

difamação e compromete a proteção dos menores.

Enquanto não reconhecermos que estamos perante uma condição caracterizada pela ausência

de escrúpulos, ética e moralidade, continuaremos a expor crianças a abusos emocionais,

comprometendo o seu bem-estar e desenvolvimento. Os narcisistas, frequentementemascarados de “bons pais”, ocupam posições de destaque e utilizam o seu carisma enganador

para disfarçar a sua verdadeira natureza.

Por isso, é essencial mantermos uma vigilância ativa, evitando sucumbir a manipulações, seja

por ingenuidade ou por conivência. Trata-se de um perfil patológico que, apesar de

extraordinariamente destrutivo, revela-se também altamente astuto, exigindo uma resposta

informada e eficaz.

REFERÊNCIAS:

BROWN, S. Mulheres que amam psicopatas. Como identificar homens com distúrbio da

personalidade. São Paulo: Editora Cultrix, [2029].

LEVINE, P. Waking the Tiger: Healing Trauma. North Atlantic Books, [1997].

LOWEN, A. El narcisismo. La enfermidade de nuestro tiempo. Paidós Psicología Hoy, [4a

Edição 2012].

PIÑUEL, I. Amor Zero. Como sobreviver a uma relação com um psicopata emocional. La

esfera de los libros, [2017].

PIÑUEL, I. Familia Zero. Cómo sobrevivir a los psicopátas en la familia. La esfera de los

libros, [3o edición. 2020].

SANDERSON, C. Abuso sexual em crianças. São Paulo: M.Books do Brasil Editora Ltda.,

[2005].

SOTTOMAYOR, M. C. A fraude da síndrome de alienação parental e a protecção das

crianças vítimas de abuso sexual. Texto correspondente à comunicação proferida em

conferencia internacional, [3 de novembro 2011].