Abuso sexual Infantil VS Alienação parental 

Abuso sexual Infantil VS Alienação parental 
Publicado em: 17/03/2025

Quem sofre são as crianças!

O Caso Marta (nome fictício) foi publicado na CNN Notícias por Patrícia Pires a 3 de dezembro de 2024.

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Este caso, como tantos outros, expõe as falhas e vulnerabilidades do sistema judicial português na investigação de abusos sexuais infantis, sobretudo quando não há provas físicas e a vítima é uma criança pequena. Quase quatro meses após a publicação da notícia, soube-se que o tribunal deferiu visitas vigiadas ao progenitor. A advogada do processo recorreu ao Tribunal da Relação, informando que a investigação ainda decorria, que havia uma testemunha a ser ouvida e que a criança ainda não tinha sido ouvida para memória futura, passados dois anos e meio. No entanto, a resposta do Tribunal da Relação foi que, como o progenitor não foi constituído arguido, goza do princípio da presunção da inocência, não colocando, assim, a criança em perigo.

O caso teve início quando a mãe, ao ouvir um relato espontâneo da filha, levou-a ao hospital. A menina alegou que o pai teria tocado nos seus órgãos genitais e que ela teria feito o mesmo a ele. Por vezes, a criança demonstrava vontade de falar sobre o ocorrido, mas hesitava, dizendo que era um segredo entre ela e o pai. Após uma visita ao progenitor, a mãe notou que a filha apresentava vermelhidão na zona genital, o que a levou a procurar assistência médica. O caso foi comunicado às autoridades, e, como medida cautelar, a Juíza determinou, a suspensão do direito às visitas e contactos a qualquer título do progenitor com a menor.

Dois anos e meio depois, o processo-crime permanece inconclusivo. O progenitor solicitou ao tribunal a retoma das visitas, alegando inocência e acusando a mãe de alienação parental, uma estratégia comum nos tribunais portugueses. O Juiz é outro, e concedeu visitas supervisionadas.

A menina continuar à espera de acompanhamento psicológico. A mãe procurou atendimento psicológico particular para a filha, logo após os relatos da menina, mas o pai não consentiu. A criança está sendo acompanhada por uma terapeuta, que já emitiu seis relatórios sobre a situação, mas estes foram desconsiderados pelo tribunal. Após dois anos, a menina confessou os “segredos” à terapeuta em um choro compulsivo, cujas gravações foram enviadas para o tribunal. No entanto, o pai ainda não foi constituído arguido, o que deixa a advogada do caso sem explicação. Após dois anos e meio, soube-se que a criança será ouvida para memória futura. 

A demora na conclusão do caso preocupa a advogada, que alerta para o risco de perda de provas e para o impacto do tempo na memória da criança. Este caso, como muitos outros, revela a ineficácia do tribunal em crimes onde as provas físicas são escassas e o abuso se manifesta essencialmente a nível psicológico. A lentidão do processo favorece o agressor, em detrimento da proteção da criança. Enquanto isso, a mãe é acusada de alienação parental, descredibilizada e difamada, tendo sido mesmo constituída arguida por difamação ao denunciar o abuso – uma obrigação civil que deveria ser incentivada e não punida.

Infelizmente é esta a táctica agressiva de um progenitor narcisista abusador se defender dos seus crimes em tribunal: difamando a progenitora através da Alienação Parental e a táctica D.A.R.V.O. 

A Necessidade de uma Resposta Judicial Eficaz na Proteção das Crianças

A ausência de provas físicas não pode ser considerada prova da inexistência de abuso. A avaliação psicológica é essencial para identificar sinais e sintomas de trauma. No entanto, onde está o acompanhamento psicológico desta criança? Até ao momento, não foi realizada nenhuma perícia psicológica!

A mãe tem suportado sozinha os custos do acompanhamento terapêutico da filha durante mais de dois anos e meio. No entanto, os relatórios da terapeuta, que indicam sintomatologia compatível com abuso sexual, foram desconsiderados pelo tribunal sob o argumento de que a profissional não possui formação específica em Psicologia. O pai recusa-se a autorizar consultas com uma psicóloga, e foi necessário esperar dois anos e meio até que o tribunal nomeasse um psicólogo. Contudo, até hoje, esse acompanhamento ainda não se concretizou.

Será que uma audição para memória futura, realizada após tanto tempo, garante realmente a proteção da criança? A demora compromete a fiabilidade das recordações e aumenta a vulnerabilidade da criança no próprio processo judicial.

O Perigo das Visitas Supervisionadas em Casos de Suspeita de Abuso

Que benefício existe em impor visitas supervisionadas entre uma criança e um progenitor que, para ela, representa uma fonte de trauma? O processo de investigação ainda decorre e, mesmo assim, o tribunal permite as visitas. Existe uma crença enraizada entre procuradores,  juízes e desembargadores de que, quando supervisionadas, as visitas não representam risco para a criança. No entanto, esta visão ignora um fator crucial: o impacto traumático psicológico e a revitimização da criança. A exposição mesmo supervisionada a um abusador pode, na verdade, activar o trauma, aumentar os sintomas já presentes e prejudicar ainda mais o bem-estar psicológico da menor. 

E qual é o objectivo das visitas supervisionadas? Não será criar um vínculo com o progenitor para que num futuro próximo seja obrigada a conviver novamente com o progenitor que abusou dela?

O Direito do Pai vs a Proteção da Criança

Porque motivo o direito do progenitor prevalece sobre a segurança da criança? A lei precisa urgentemente de ser reformulada, colocando o superior interesse da criança no centro das decisões. Um progenitor abusador-narcisista não pode ser considerado um bom pai. A paternidade não se resume a um vínculo biológico; exige proteção, cuidado e respeito pelo bem-estar dos filhos.

O sistema judicial precisa de evoluir para garantir que as crianças são protegidas, independentemente da falta de provas físicas. O tempo que se perde nestes processos pode custar a segurança e o futuro de muitas crianças.

Dia 21 de março pelas 13:30 vamos falar sobre este caso e outros numa Live com uma psicóloga especialista em abusos sexuais e outras convidadas, fica já o convite para participar.

REFERÊNCIAS

  • BROWNE, A., & Finkelhor, D. (1986). Impact of child sexual abuse: A review of the research. Psychological Bulletin, 99(1), 66-77.
  • DIAS & Pinheiro (2008). Escritos de direito de família.
  • Ferenczi, S. (1933). Confusão de Línguas entre os Adultos e a Criança. In Obras Completas de Sándor Ferenczi.
  • Figueiredo, L. C. (2012). Trauma e sofrimento psíquico: Contribuições para a teoria e clínica psicanalítica. Companhia das Letras.
  • Herman, J. L. (1992). Trauma and Recovery: The Aftermath of Violence—from Domestic Abuse to Political Terror. Basic Books.
  • Freyd, J. introduced the term “DARVO” near the end of a 1997 publication about her primary research focus, “betrayal trauma theory.” https://www.jjfreyd.com/darvo
  • PIÑUEL, I. Amor Zero. Como sobreviver a uma relação com um psicopata emocional. La esfera de los libros, [2017].
  • PIÑUEL, I. Familia Zero. Cómo sobrevivir a los psicopátas en la familia. La esfera de los libros, [3o edición. 2020].
  • SANDERSON, C. Abuso sexual em crianças. São Paulo: M.Books do Brasil Editora Ltda., [2005].
  • SOTTOMAYOR, M. C. A fraude da síndrome de alienação parental e a protecção das crianças vítimas de abuso sexual. Texto correspondente à comunicação proferida em conferencia internacional, [3 de novembro 2011]. Maria Clara Sottomayor